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Não me machuca mais

Quando começamos a analisar uma situação por outra perspectiva, passamos a nos tornar mais racionais. Nossos olhos se abrem e, antes que o coração interfira, entendemos como uma relação passada teve bons e maus momentos e que durou o tempo certo. Saber que tudo tem seu fim é aceitar de forma madura que somos capazes de sentir, de nos impormos limites e de dizer, de cabeça erguida, que nem tudo foi feito para nós. E, assim, podemos seguir em frente e abraçar com afinco a nossa próxima jornada.

Olá, você se lembra de mim? Já faz algum tempo que nosso amor terminou. Claro que chorei, gritei, senti saudades e odiei seu nome. Por fim, os sentimentos se perderam. Voltei a viver. Acredito que tenha acontecido o mesmo com você.

Há algumas semanas, brincando com minhas memórias, lembrei-me de nossa história. Não, não estou pedindo um retorno, mas acho engraçado – e estranho também – de quando dizíamos que era tudo tão perfeito entre nós, quando prometíamos a eternidade ao outro, quando, com a voz manhosa, declamávamos o amor recíproco de outrora.

E aí, sem qualquer preparo, o destino rumou, distintos, nossos caminhos. O “nós” tornou-se o “eu e você”, distantes. Nossos corações não mais palpitavam em sincronia. Estranhos aos olhos do outro, partimos. Por um tempo, doeu. Depois, a solidão, apeteceu.

Embora nunca haja um porquê – ou assim o preferimos – tudo se acabou. Passamos a procurar novamente a nossa felicidade, pois ali já não mais cabia. Agora somos apenas história, de outras pessoas em outros lugares, de novos trilhos.

Eu só queria dizer a você uma última coisa. Lembrar-lhe como foi incrível estar ao seu lado. O que aprendi é algo que levarei pela vida. Eu aprendi a ouvir e respeitar você pelo tempo bom que tivemos. Os ruins se esvairão como a poeira, que não faço questão de carregar nem sob a sola dos meus sapatos.

Agora, finalmente posso partir, deixando para trás todos os meus rastros. A vida continua, independente de quem esteja comigo. A alma às vezes nos suplica que abandonemos aquilo que ela guardou tão profundamente, por isso dói tanto arrancá-lo dali. Mas, como as feridas, a alma se cicatriza e se permite pronta para a próxima. E a minha está.

Findo aqui, nesta carta, mais uma página, que o vento haverá de soprar.

If the World Didn’t Suck (We Would All Fall Off)

Quando eu tinha apenas dois anos,  meu pai, segurando-me em seus braços, olhou-me nos olhos e disse: “Você é capaz de dar seus próprios passos”. Pôs-me no chão e a cena seguinte consistia em um lento caminhar de uma pequena criança numa pequena sala. Quando eu cresci, segurando minha mão, ele me disse: “Não pare até encontrar seu próprio caminho”. Soltou-me e a próxima cena era de uma pequena criança, num corpo de um adulto, caminhando por uma grande sala conhecida como mundo.

E assim minhas primeiras pegadas faziam marcas por longos trilhos percorridos com uma grande interrogação pairada sobre minha cabeça. “Afinal, o que significavam suas doces palavras?”

Com minha mochila nas costas e pouca bagagem, viajei por histórias diversas. Fiz escolhas boas e más. Em algumas estradas, podia relaxar, descansar, tomar um pouco de sol e me banhar em águas claras, sentindo o frescor do vento da colina. Em outros, espinhos, subidas íngremes, buracos, cobras. Outros, não havia nada, simplesmente.

Algumas vezes me perdi. Curvas e bifurcações me confundiam e me intimidavam.Entretanto, fiz-me amadurecer e refletir a cada novo passo. Um pequeno tijolo chamado aprendizado que aos poucos iam levantando um grande castelo chamado sabedoria.

Durante minha jornada, sentava-me à sombra fresca de meus pensamentos e escrevia uma nova poesia. Novos forasteiros se ofereciam para caminhar ao meu lado. Outros, mais pretensiosos, guiavam-me por um caminho próprio. Era minha decisão segui-los ou não. Convenciam a mim sobre o que deveria ou não fazer. Aos poucos me moldavam.

Quando me apaixonei, o amor me levou a uma bela ilha e por um tempo pude apreciar uma nova paisagem. Pomares, represas, tigres e alpinistas, deram lugar a peixes, areia, palmeiras e água salgada. Um novo sabor a ser degustado.

Foi uma breve distração que, por algum tempo, me fez crer que ali se escrevia mais um final feliz. Não era verdade. Quando me dei conta, olhei para os lados e me vi solitário naquele paradisíaco lugar. Não deveria eu ter finalmente encontrado meu caminho?

Ao regressar, um novo impasse: alguns viajantes já não estavam mais ali e algumas de minhas poesias transformaram-se em pó logo soprados pelo vento. Aquela ‘pedra no meio do caminho’, me fizera tropeçar.

Então, pude perceber algo: minha história não terminaria assim. Caminhando por novas estradas, outros viajantes me encontravam e escreviam novas poesias em meu diário. Então, pela primeira vez, senti a liberdade tomar conta de mim. Eu mesmo era capaz de guiar outros tantos viajantes e escutar tão semelhantes histórias vividas.

Por tanto tempo, não percebi que aquele já era meu caminho. Não importava o quanto havia vivido, sempre outros trilhos surgiam e as más escolhas por vezes se repetiam, tais quais as boas, impedientes de desmotivação. Nestas, encontravam-se meu apoio.

Pare um pouco e me ouça com atenção. Se sua mente não tiver ciência de que estamos num ciclo em que apenas alguns personagens e meras características são capaz de sofrer suas generosas alterações, talvez você não compreenda que, enquanto aprendemos a dar nossos passos, já somos escritores de nossos livros, sem direito a apagadores ou borrachas. Somos o que somos para valer, não meros expectadores.

Por isso, é hora de fazer valer. Tenha os pés no chão. Tudo bem se a mente flutuar de vez em quando, é normal, mas lembre-se: você é o personagem principal. Não é hora de se caracterizar tal papel com tamanho afinco?

Ao finalmente retornar a meu lar, coloquei minha mochila sobre minha cama e a esvaziei, admirando cada item retirado. Encontrei poesias, canções, sonhos, odores, sabores, marcas, sujeira, lágrimas, sorrisos, olhares, lembranças, flores, roupas, brigas, amizades, amores, mistérios, verdades, mentiras, sins, nãos, talvez. Encontrei enredo. Encontrei desfecho.

Quando eu tinha apenas dois anos,  meu pai, segurando-me em seus braços, olhou-me nos olhos e disse: “Você é capaz de dar seus próprios passos”.

https://www.youtube.com/watch?v=J9ab1a0mtpg

Titanium

Críticas, falhas, defeitos, má postura, más atitudes. Inveja? “Em seu lugar eu faria melhor, eu seria diferente, eu não cometeria os mesmos erros.” Será que não? Seria esse o ser perfeito que tenho buscado por toda a minha vida?

Fala mais alto, por favor. Não há como te escutar. Ouço tuas críticas por todos os lados. Se apoio alguma causa, rebates por eu estar em algo errado. Deveria eu ajudar o próximo ou deveria ajudar um mundo tão gigante? Podes me ajudar ou apenas sabes me crucificar?

Atira para meu lado. Tuas balas não me atingem. O que há contigo? Será que não és capaz de algo melhor? Essas balas ricocheteiam. O que há com elas que não me atingem? Quando acertam, não as sinto. Hmm, talvez, eu seja… Não! Talvez não! Eu sou! Sim! Eu sou a prova de balas.

Eu conheço meu potencial. Sei que sou bom e melhoro para isso. Tuas palavras tão inférteis. A razão disso é teu ser. Queres que eu seja um perfeito ser, quando tu nem te dás o trabalho de melhorar. Essa tua preocupação em demasia em meu ser me preocupa. Por que não podes guardar teus conselhos a ti mesmo. É tão difícil?

Uma dica. Se queres tanto assim que eu mude, troca de armas. Acaba comigo. Faz disso uma guerra. Faz-me à tua mercê. Faz-me teu subordinado. Ergue teu timbre de voz e me ataca com paus e pedras. Usa tua metralhadora. Destrói cada rincão de mim, mas age com maestria.

Não consegue, sabe por quê? Sou feito de titânio. Eu tive minhas lições durante meu percurso e nunca precisei ser mau. Nunca, ao contrário de ti. Busco o melhor para mim e sei disso, vejo todo o resultado neste contínuo processo. Não sou perfeito, nem posso ser. O importante é que estou bem e procuro que todos fiquem bem consigo mesmo.

Já viste meus textos? São parte de mim. Sei que com eles consigo fazer bem a alguém. Conhece minhas atitudes? Sei que já fiz exemplo para muitos. E sigo assim. É o que me faz bem.

E se não podes satisfazer-te com isso, grita mais, atira pro lado certo, tenta contra mim outra vez. Não é capaz? Claro que não! Eu sou feito de titânio.

Indicação: Diego Gomes