Joãozinho chega na padaria e pergunta:
– Moço, tem pão?
O padeiro responde:
– Só tem pão dormido.
– Ah, então acorda cinco aí pra mim.
Arquivo da categoria: Estante
Frases de Reflexão (pt. 2)
“Como são admiráveis as pessoas que não conheço bem… nunca acredite em ninguém!”
“Antes de magoar o coração, pense bem, pois você está dentro dele”
“Nada é impossível, quando se acredita em Deus” – Carlla Luiza Pessoa
“Não sou o dono do mundo, mas sou o filho do dono”
“Não mude seu jeito apenas porque alguém pediu, mude para cada dia tornar-se melhor e uma pessoa de bem”
“Para conseguir realizar um sonho, não basta apenas sonhar, tem que acreditar”
“Sempre pense duas ou até mais vezes antes de agir ou dizer qualquer coisa”
“A vida é como se fosse um espelho, devolve a cada pessoa o reflexo de seus próprios pensamentos, crenças e entusiasmo”
“Os homens se ocupam mil vezes mais em adquirir riqueza do que cultura e, no entanto, o que somos contribui muito mais para a nossa felicidade do que o que temos” – Schopenhauer
“Todo o caminho do homem é reto aos seus próprios olhos, mas o senhor sonda os corações” – Provérbios 21:2-4
“A justiça se defende com razão e não com armas. Não se perde nada com paz, e pode perder-se tudo com a guerra”
“Onde há boa vontade, há esperança”
“A felicidade é um direito de todos, mas para ser feliz, é preciso saber perdoar e amar”
“As nossas ações estão marcadas na mente das pessoas que nos cercam, façamos delas um instrumento de amor, lutando por um mundo melhor”
“O homem deve criar as oportunidades e não somente encontrá-las” – Francis Bacon
“Somos o que fazemos, mas somos, principalmente o que fazemos para mudar o que somos” – Eduardo Galeano
“Quando se busca o cume da montanha, não se dá importância às pedras do caminho” – Provérbio oriental
“Faça de si uma pessoa honesta e esteja certo que há menos um patife no mundo”
Chuva com lembranças – Cecília Meireles
Começam a cair uns pingos de chuva. Tão leves e raros que nem as borboletas ainda perceberam, e continuam a pousar, às tontas, de jasmim em jasmim. As pedras estão muito quentes, e cada gota que cai logo se evapora. Os meninos olham para o céu cinzento, estendem a mão — e vão tratar de outra coisa. (Como desejariam pular em poças d’água! — Mas a chuva não vem…)
Nas terras secas, tanta gente, a esta hora, estará procurando também no céu um sinal de chuva! E, nas terras inundadas, quanta gente a suspirar por um raio de sol!
Penso em chuvas de outrora: chuvas matinais, que molham cabelos soltos, que despencam as flores das cercas, entram pelos cadernos escolares e vão apagar a caprichosa caligrafia dos exercícios.
Chuvas de viagens: tempestades na Mantiqueira, quando nem os ponteiros dos para-brisas dão vencimento à água; quando apenas se avista, recortada na noite, a paisagem súbita e fosfórea mostrada pelos relâmpagos. Catadupas despenhando sobre Veneza, misturando o céu e os canais numa água única, e transformando o Palácio dos Doges num imenso barco mágico, onde se movem, pelos tetos e paredes, os deuses do paganismo e os santos cristãos. Chuva da Galiléia, salpicando as ruas pobres de Nazaré, regando os campos virentes, toldando o lago de Tiberíades coberto ainda pelo eterno olhar dos Apóstolos. Chuva pontual sobre os belos campos semeados da França, e na fluida paisagem belga, por onde imensos cavalos sacodem, com displicente orgulho, a dourada crina…
Chuvas antigas, nesta cidade nossa, de perpétuas enchentes: a de 1811, que, com o desabamento de uma parte do morro do Castelo, soterrou várias pessoas, arrastou pontes, destruiu caminhos e causou tal pânico que durante sete dias as igrejas e capelas estiveram abertas, acesas, com os sacerdotes e o povo a implorarem a misericórdia divina. Uma, de 1864, que Vieira Fazenda descreve minuciosamente, com árvores arrancadas, janelas partidas, telhados pelos ares, desastres no mar e “vinte mil Lampiões da iluminação pública completamente inutilizados”.
Chuvas modernas, sem trovoada, sem igrejas em prece, mas com as ruas igualmente transformadas em rios, os barracos a escorregarem pelos morros, barreiras, pedras, telheiros a soterrarem pobre gente. Chuvas que interrompem estradas, estragam lavouras, deixam na miséria aquêles justamente que desejariam a boa rega do céu para a fecundidade de seus campos.
Por enquanto, caem apenas algumas gotas daqui e dali. Nem as borboletas ainda percebem. Os meninos esperam em vão pelas poças dágua onde pulariam contentes. Tudo é apenas calor e céu cinzento, um céu de pedra onde os sábios e avisados tantas coisas liam outrora:
“São Jerônimo, Santa Bárbara Virgem,
lá no céu está escrito, entre a cruz e a água benta:
Livrai-nos, Senhor, desta tormenta!”
Texto extraído do livro “Quadrante 2 – 4ª Edição (com Biografias)”, Editora do Autor – Rio de Janeiro, 1963, págs. 48 e 49.
A menina que pisou no pão – Andersen
Era uma vez uma menina pobre, mas de natureza rebelde, que revelou más inclinações desde muito cedo. Quando pequenina, seu maior prazer era apanhar moscas e arrancar-lhes as asas, para vê-las depois andar se arrastando. Apanhava besouros e grilos e espetava-os em um alfinete; punha depois uma folha de livro, ou qualquer pedaço de papel bem próximo dele, para que pudessem segurá-lo com as patinhas – só pelo prazer de vê-los agitaram-se e torcerem-se, na ânsia de se libertar do alfinete.
– O besouro está lendo – dizia a pequena Inger.
– Vejam como ele vira a página!
E, ao passo que ia crescendo, tornava-se cada vez pior. Era muito bonita, mas foi isso a sua infelicidade, sem dúvida.
– Será preciso um rude golpe para te fazer curvar a cabeça, – dizia a mãe. – Quando era menor, muitas vezes pisoteaste meu avental; receio muito que quando fores grande me pisoteies o coração!
E assim aconteceu.
Inger teve de ir para o campo, para servir em casa de uma família rica. Tratavam-na como se fosse filha e vestiam-na muito bem. Ia ficando cada vez mais bonita, mas o seu caráter não melhorava.
Um ano depois de estar lá, disseram-lhe os patrões:
– Deves ir visitar teus pais, Inger!
Ela foi, mas apenas com a intenção de se mostrar, para que vissem como andava bem-vestida. Ao chegar aos portões da cidade, viu alguns moços e moças que conversavam à beira do lago, e, sentada entre eles, sua mãe, com um feixe de lenha ao ombro.
Inger deu volta. Sentiu-se envergonhada de ter por mãe – ela, tão fina! – aquela velha esfarrapada, que juntava lenha no mato. Não ficou nem de leve compadecida; ao contrário, sentia-se irritada com aquilo.
Passou-se mais meio ano, e sua ama disse-lhe:
– Inger, é preciso que vás visitar teus pais. Leva-lhes este pão de trigo. Hão de ficar bem contente de te ver.
Inger vestiu suas melhores roupas e calçou os sapatos mais finos que tinha. Ergueu as saias, e caminhava com muito cuidado, para não sujar os sapatos. Certamente não merece censura por isso; mas quando chegou àquele ponto em que o caminho atravessa o brejo, e viu que estava todo cheio de lama, atirou no barro o pão que trazia, para passar por cima dele sem sujar os sapatos. Quando estava assim, com um pé sobre o pão e o outro erguido para dar mais um passo, o pão afundou-se, e foi se enterrando cada vez mais, até que desapareceu, levando-a consigo. E nada mais se viu ali a não ser o charco negro e cheio de bolhas.
Mas a menina? Que foi feito dela? Inger foi dar onde estava a mulher do Brejo, que tem uma cervejaria lá embaixo. A mulher do Brejo é irmã do rei dos Duendes, e tia da Bruxas, que são muito conhecidas. Muita gente tem escrito versos a respeito delas; outros pintaram os seus retratos; mas só o que sabemos a respeito da mulher do Brejo é que quando o nevoeiro se ergue nos campos, no verão, é que ela está fabricando sua cerveja. E foi nessa cervejaria que Inger caiu; mas lá ninguém pode permanecer muito tempo. Um carro de lixeiro é coisa suave, comparada com a cervejaria da mulher do Brejo. O cheiro dos barris é o quanto basta para deixar uma pessoa doente, e estão tão juntos que não se pode passar entre eles; além disso, onde há por acaso alguma frestinha, está cheia de sapos asquerosos e cobras viscosas. E foi entre todas estas horrendas imundícies vivas que caiu a pequena Inger. O frio era tão intenso que ela tremia, e já sentia os membros rígidos. O pão aderiu firmemente aos seus pés, e levou-a para baixo.
A mulher do brejo estava em casa. O velho Trasgo e seu bisavô encontravam-se lá de visita. A bisavó é uma mulher venenosa, e nunca está ociosa. Nunca sai sem levar o seu trabalho, e tinha-o à mão naquele dia. Estava ocupada em fabricar couro andejo para por nos sapatos das pessoas, de modo que quem os usasse não podia ter descanso. Bordava mentiras, e juntava todas as palavras inúteis que caíam no chão, para fazer dano com elas. Sim! A velha bisavó pode fazer tricôs e bordados muito finos!
Assim que avistou Inger pôs os óculos e olhou-a de alto a baixo, dizendo logo:
– Esta menina me interessa! Gostaria de levá-la, como lembrança da minha visita. Daria uma boa estátua para o corredor exterior da casa do meu bisneto.
Desse modo Inger foi a Terra dos Trasgos. Nem sempre as pessoas vão lá por esse caminho direto, visto que é fácil ir por caminhos mais extenso.
Era um corredor que nunca se acabava: dava vertigem olhar para diante ou para trás. Lá estava uma multidão ignominiosa, à espera de que se abrisse a porta da misericórdia; mas muito tinham que esperar! Grandes e gordas aranhas agitavam-se, tecendo teias de mil anos ao redor de seus pés: e aquelas teias pareciam parafusos, que a prendiam fortemente, como se estivessem amarradas com correntes de cobre. Além disso, todas as almas padeciam um eterno desassossego; um tormento perpétuo. O infeliz que tinha esquecido a chave do seu cofre, sabia que a deixara na fechadura. Mas seria uma nunca acabar, se eu quisesse enumerar todas as torturas daquele lugar. Inger sofria o tormento de parar em pé como uma estátua, com um pão colado aos pés.
– Foi o que ganhei, por querer conservar os sapatos limpos! – dizia ela consigo. – Vejam como eles olham para mim!
Era verdade que todos olhavam para ela, e todas as suas más paixões lhes brotava, dos olhos, falando sem que os lábios se abrissem em palavras. Era uma visão terrível!
– Deve dar grande prazer olhar para mim!- pensava Inger. – Tenho um rosto lindo e belas roupas.
Voltou então os olhos para se ver; o pescoço também estava rígido. Mas oh! como se sujara na cervejaria da esposa do Brejo! Nunca se lembrara de semelhante coisa…A roupa estava coberta de lama viscosa; uma cobra se lhe enroscara no cabelo e caía-lhe pelas costas. De cada prega do vestido espiava um sapo, coaxando sem parar. Era horrível! Mas sentia consolo, pensando:
– Todo os outros que se encontraram aqui embaixo estão tão medonho como eu!
Mas o pior era a fome devoradora que sentia; e não podia abaixar-se para tirar um pedaço do pão que tinha nos pés. Não; não podia; mãos e braços haviam endurecido, e todo o seu corpo era como um pilar de pedra. Só podia mover os olhos, mas isso, sim! podia movê-los em redor e olhar para trás. E que medonha visão aquela! Vieram as moscas, que lhe andavam por cima dos olhos, e por mais que ela pestanejasse, não iam embora; não, as moscas não podiam sair, porque ela lhes tinha arrancado as asas, virando-as em insetos rastejantes.
Era um grande suplício da fome que a devorara por dentro; parecia-lhe que já estava completamente vazia.
– Se isto durar muito, eu não poderei suportar – pensou Inger.
Mas aquilo continuou, ela teve de suportar.
Foi então que uma lágrima escaldante lhe caiu sobre a fronte, e foi escorrendo pela face e pelo peito abaixo, até cair sobre o pão; e depois outra, e mais outra, e aquilo já parecia uma chuva.
Mas quem estaria chorando pela pequena Inger? Pois ela não tinha uma mãe na terra? As lágrimas de tristeza que uma mãe chora pelo seu filho sempre o alcançam; contudo, não lhe trazem alívio; elas queimam, e tornam o tormento cinquenta vezes pior. E a fome terrível de novo a assaltou, e ela sem poder apanhar o pão que tinha nos pés! Afinal experimentou uma sensação estranha: parecia-lhe que estava a se comer a si própria, e que já nada mais era senão um caniço oco, que conduz todos os sons. Ouvia distintamente tudo o que se dizia na terra a seu respeito, e tudo o que ouvia eram palavras duras.
Sua mãe, é certo, chorava triste e amargurada, mas dizia:
– O orgulho sempre precede a queda! Foi a tua infelicidade, Inger! Como magoaste tua mãe!
Não só sua mãe, mas todos na terra sabiam o que ela havia feito; sabiam que tinha pisado no pão e que submergira no paul. Souberam pelo pastor, que tinha visto tudo de cima do montículo onde se achava.
– Como afligiste tua mãe -Inger – dizia a pobre mulher. – Mas eu bem te avisava!
– Antes eu nunca tivesse nascido! – pensava Inger. – Seria muito melhor para mim. As lágrimas de minha mãe não me servem de nada agora!
Ouviu também seus antigos patrões, pessoas tão boas, que tinham sido para ela o mesmo que pais, falando a seu respeito:
– Era uma menina pecadora. Não dava valor aos dons de Deus, e pisava-os aos pés. Será difícil para ela abrir a porta da misericórdia!
Mas Inger pensava lá embaixo;
– Deviam ter-me educado melhor! Deviam ter dominado a minha soberba, se eu a tinha.
Ouviu também uma canção que escreveram e que era cantada por toda a parte:
” Menina tão arrogante.
Que caminhou sobre um pão
P’ra não sujar os sapatos!”
– E terei de ouvir sempre esta velha história, e sofrer com isso! – pensava ela. – Mas os outros também deviam ser punidos pelos seus pecados. Haveria muito o que castigar! Oh! como sofro!
E seu coração se endurecia ainda mais que a casca de fora.
Ninguém poderá melhorar nada nesta companhia em que estou! E eu não quero mesmo ficar melhor…Oh! Agora estão todos olhando para mim!
E Inge tinha o coração cheio de ódio e má vontade para com todos.
– Agora terão assunto para conversar lá em cima! Que tortura!
Ouvia as pessoas contarem, sua história às crianças; e estas diziam sempre:
– Malvada Inger! Era tão perversa que teve de sofrer tormentos!
E só ouvia da boca das crianças palavras duras.
Mas um dia, quando sentia o ódio e a fome a lhe roerem a casca vazia, ouviu o seu nome; alguém contava a sua história a uma criancinha inocente, uma meninazinha, e a criança rompeu a chorar, ouvindo a história da orgulhosa e vaidosa Inger. E perguntou:
– Ela nunca subirá para a terra outra vez?
– Ela nunca tornará a subir para a terra- disse a outra voz.
– Mas e se ela pedir perdão e prometer não tornar a fazer isso? – perguntou a criança.
– Ela não pedirá perdão – disseram-lhe.
– Mas eu queria que ela pedisse! – insistiu a criancinha, que não aceitava explicações. – Eu dou a casa da minha boneca, para ela subir outra vez…É horrível o que aconteceu com a pobre da Inger!
Aquelas palavras chegaram ao coração de Inger, e parece que lhe fizeram bem. Era a primeira vez que alguém dizia: ” Pobre da Inger!” sem acrescentar alguma coisa a respeito das sua más ações. Uma criancinha inocente chorava e orava por ela, e aquilo lhe causava uma sensação estranha: desejaria chorar também, mas seus olhos não podiam derramar uma só lágrima, e isso ainda lhe aumentava o tormento.
Assim como os anos iam passando em cima, foram também correndo lá embaixo, sem que coisa alguma se modificasse: Inger já não ouvia falar tanto de si. Mas um dia percebeu um suspiro:
– Inger, Inger, quanto desgosto me causaste! Eu bem sabia que havia de ser assim!
Era sua mãe que estava moribunda.
Ouviu também o seu nome repetido pelos seus antigos patrões, e as palavras menos cruéis que sua ama disse foram estas:
– Chegarei a ver-te outra vez, Inger? A gente nunca sabe para onde irá!
Mas Inger sabia bem que sua ama, tão boa, tão virtuosa, jamais iria ter ao lugar onde ela estava.
Passou-se novo e longo período cheio de amargura. Inger tornou a ouvir o seu nome; e viu acima da sua cabeça duas coisas que pareciam duas estrelas cintilantes; eram de fato dois olhos que se fechavam na terra, tantos anos se passaram depois que aquela criança tinha chorado tão sentidamente ao ouvir a história da “pobre Inger”, que ela era agora uma anciã, a quem o senhor chamava para ao Seu lado. No último momento, quando a vida inteira da criatura lhe volta à memória, ela se lembrou das lágrimas que derramara por causa de Inger. E a impressão era tão clara na hora da morte, que a velhinha exclamou em voz alta:
– Senhor! Oxalá eu não tenha jamais, como Inger, calçados aos pés, sem o saber, teus dons abençoados. Oxalá também eu não tenha jamais nutrido orgulho no coração. Não me abandones agora na minha última hora!
Fecharam-se os olhos da velha dama, e os olhos de sua alma se abriram para ver as coisa ocultas; e como Inger tinha estado tão nitidamente presente nos seus últimos pensamentos, via agora quão profunda fora a queda da menina. E, àquela vista, desatou a chorar. E fico, feito uma criança, chorando pela pobre Inger, no reino dos Céus. Suas lágrimas e suas preces ecoaram na casca oca e vazia que encerrava a alma prisioneira e torturada, agora completamente vencida por todo aquele amor vindo de cima. Um anjo de Deus, chorando por ela! Por que lhe era feita esta concessão? A alma torturada lembrava-se de cada ação terrena que praticara, e afinal desatou a chorar, e Inger chorou, como jamais fizera. Sentia-se agora cheia de tristeza pelos seus atos; chorou como se a grande porta de misericórdia nunca pudesse abrir-se para ela. Mas quando reconheceu isso em humildade e contrição, um raio de luz brilhou no abismo em que caíra. O poder daquele raio de luz era muito maior do que o da luz do sol que derrete o homem de neve feito pelos meninos no jardim; e mais depressa, muito mais depressa do que se derrete um floco de neve dos lábios quentes de uma criança, dissolveu-se diante dele a forma petrificada de Inger, e um passarinho voou com a rapidez do relâmpago para o mundo de cima. Estava muito assustado e tinha medo de tudo. Sentia-se vexado; receava encontrar o olhar de qualquer ser vivente; e procurou mais que depressa abrigar-se em uma fenda da parede. Naquele esconderijo encolheu-se todo, tremendo da cabeça aos pés; não podia articular som algum, porque não tinha voz. E ali ficou muito tempo, antes que pudesse olhar com calma as coisas admiráveis que o cercavam. Sim, era na verdade admiráveis! O ar era tão suave e tão fresco, a lua brilhava com tanto fulgor, as árvores e arbustos exalavam tanto perfume! E além de tudo isso, já tão agradável, ainda suas penas estava limpas, tão brilhantes! Como toda a criação falava de amor e de beleza! O passarinho bem desejaria cantar alegremente, exprimindo todos os sentimentos que lhe brotavam no peito; entretanto não lhe era possível cantar. Teria gorjeado com a maior alegria, como os cucos e os rouxinóis fazem no verão. O bom Deus, que ouve até os mudos hinos de louvor de um verme, compreendia também aquele cântico de gratidão que tremia no peito do passarinho, da mesma maneira que os salmos de David ecoavam no seu coração antes que tomassem forma em palavras e melodia. Aqueles pensamentos e aqueles cânticos sem voz foram crescendo e foram aumentando durante semanas; deviam expandir-se, e à primeira tentava para praticar uma boa ação, achariam a saída.
Era o tempo da Festa de Natal. Os camponeses ergueram um mastro contra um muro e amarraram um feixe de aveia na ponta, para que os passarinhos pudessem ter um bom repasto naquele dia feliz.
O sol surgiu brilhante e iluminou o molho de aveia, e os passarinhos cercaram o mastro, pipilando. Foi Então que daquela fresta da parede veio um pio fraquinho; os sentimentos sempre em aumento do passarinho tinham achado uma voz, e aquele débil pipilar era ao seu hino de louvor. Tinha despertado nele o pensamento de uma boa ação, e o passarinho voou, abandonando seu esconderijo; no Reino dos Céus era ele bem conhecido.
O inverno corria áspero, e toda a água estava coberta por uma camada de gelo. Era com grande dificuldade que as aves e os outros animais encontravam alimento. O passarinho voava à beira da estrada, encontrava de vez em quando um grão de trigo nos sulcos dos trenós. Achava também alguns farelos de pão perto das hospedarias, mas comia apenas uma migalha, pois queria deixar bastante alimento para os outros passarinhos que ali aparecessem. Voou então para as cidades e espiava nas cercanias. Onde quer que alguma mão carinhosa tivesse espalhado migalhas de pão para os passarinhos, ele comia apenas uma só e deixava o restante.
No decorrer do inverno o passarinho tinha assim renunciado, em favor dos outros, tantas migalhas de pão que elas já igualavam em peso aquele pão inteiro que a pequena Inger calçara aos pés, para não sujar os sapatos. Então as asas cinzentas do passarinho ficaram brancas e foram se distendendo, e as crianças que viram aquela ave branca disseram:
– Lá anda uma gaivota, voando sobre o mar.
A ave ora mergulhava nas águas, ora voava e remontava muito alto. E, contra a intensa luz que brilhavam no espaço, não foi possível ver que fim levou.
As crianças afirmaram que ela entrou no sol.
Segunda ou terça-feira – Virginia Woolf
Preguiçosa e indiferente, vibrando facilmente o espaço com suas asas, conhecendo seu rumo, a garça sobrevoa a igreja por baixo do céu. Branca e distante, absorta em si mesma, percorre e volta a percorrer o céu, avança e continua. Um lago? Apaguem suas margens! Uma montanha? Ah, perfeito – o sol doura-lhe as margens. Lá ele se põe. Samambaias, ou penas brancas para sempre e sempre.
Desejando a verdade, esperando-a, laboriosamente vertendo algumas palavras, para sempre desejando – (um grito ecoa para a esquerda, outro para a direita. Carros arrancam divergentes. Ônibus conglomeram-se em conflito) para sempre desejando – (com doze batidas eminentes, o relógio assegura ser meio-dia; a luz irradia tons dourados; crianças fervilham) – para sempre desejando a verdade. O domo é vermelho; moedas pendem das árvores; a fumaça arrasta-se das chaminés; ladram, berram, gritam “Vende-se ferro!” – e a verdade?
Radiando para um ponto, pés de homens e pés de mulheres, negros e incrustados a ouro – (Este tempo nublado – Açúcar? Não, obrigado – a comunidade do futuro) – a chama dardejando e enrubescendo o aposento, exceto as figuras negras com seus olhos brilhantes, enquanto fora um caminhão descarrega, Miss Fulana toma chá à escrivaninha e vidraças conservam casacos de pele.
Trêmula, leve-folha, vagueando nos cantos, soprada além das rodas, salpicada de prata, em casa ou fora de casa, colhida, dissipada, desperdiçada em tons distintos, varrida para cima, para baixo, arrancada, arruinada, amontoada – e a verdade?
Agora recolhida pela lareira, no quadrado branco de mármore. Das profundezas do marfim ascendem palavras que vertem seu negrume. Caído o livro; na chama, no fumo, em momentâneas centelhas – ou agora viajando, o quadrado de mármore pendente, minaretes abaixo e mares indianos, enquanto o espaço investe azul e estrelas cintilam – verdade? Ou agora, consciente da realidade?
Preguiçosa e indiferente, a garça retoma; o céu vela as estrelas; e então as revela.
O Assalto – Carlos Drummond
Na feira, a gorda senhora protestou a altos brados contra o preço do chuchu:
— Isto é um assalto!
Houve um rebuliço. Os que estavam perto fugiram. Alguém, correndo, foi chamar o guarda. Um minuto depois, a rua inteira, atravancada, mas provida de um admirável serviço de comunicação espontânea, sabia que se estava perpetrando um assalto ao banco. Mas que banco? Havia banco
naquela rua? Evidente que sim, pois do contrário como poderia ser assaltado?
— Um assalto! Um assalto!
— A senhora continuava a exclamar, e quem não tinha escutado, escutou, multiplicando a notícia. Aquela voz subindo do mar de barracas e legumes era como a própria sirena policial, documentando, por seu uivo, a ocorrência grave, que fatalmente se estaria consumando ali, na claridade do dia, sem que ninguém pudesse evitá-la.
Moleques de carrinho corriam em todas as direções, atropelando-se uns aos outros. Queriam salvar as mercadorias que transportavam. Não era o instinto de propriedade que os impelia. Sentiam-se responsáveis pelo transporte. E no atropelo da fuga, pacotes rasgavam-se, melancias rolavam, tomates esborrachavam-se no asfalto. Se a fruta cai no chão, já não é de ninguém; é de qualquer um, inclusive do transportador. Em ocasiões de assalto, quem é que vai reclamar uma penca de bananas meio amassadas?
— Olha o assalto! Tem um assalto ali adiante!
O ônibus na rua transversal parou para assuntar. Passageiros ergueram-se, puseram o nariz para fora. Não se via nada. O motorista desceu, desceu o trocador, um passageiro advertiu:
— No que você vai a fim do assalto, eles assaltam sua caixa.
Ele nem escutou. Então os passageiros também acharam de bom alvitre abandonar o veículo, na ânsia de saber, que vem movendo o homem, desde a idade da pedra até a idade do módulo lunar.
Outros ônibus pararam, a rua entupiu.
— Melhor. Todas as ruas estão bloqueadas. Assim eles não podem dar no pé.
— É uma mulher que chefia o bando!
— Já sei. A tal dondoca loira.
— A loura assalta em São Paulo. Aqui é morena.
— Uma gorda. Está de metralhadora. Eu vi.
— Minha Nossa Senhora, o mundo está virado!
— Vai ver que está caçando é marido.
— Não brinca numa hora dessas. Olha aí sangue escorrendo!
— Sangue nada, é tomate.
Na confusão, circularam notícias diversas.
O assalto fora a uma joalheria, as vitrinas tinham sido esmigalhadas a bala. E havia joias pelo chão, braceletes, relógios. O que os bandidos não levaram, na pressa, era agora objeto de saque popular. Morreram no mínimo duas pessoas, e três estavam gravemente feridas. Barracas derrubadas assinalavam o ímpeto da convulsão coletiva. Era preciso abrir caminho a todo custo. No rumo do assalto, para ver, e no rumo contrário, para escapar. Os grupos divergentes chocavam-se, e às vezes trocavam de direção; quem fugia dava marcha à ré, quem queria espiar era arrastado pela massa oposta. Os edifícios de apartamentos tinham fechado suas portas, logo que o primeiro foi invadido por pessoas que pretendiam, ao mesmo tempo, salvar o pelo e contemplar lá de cima. Janelas e balcões apinhados de moradores, que gritavam:
— Pega! Pega! Correu pra lá!
— Olha ela ali!
— É um mascarado! Não, são dois mascarados!
Ouviu-se nitidamente o pipocar de uma metralhadora, a pequena distância. Foi um deitar no chão geral, e como não havia espaço uns caíam por cima de outros. Cessou o ruído, Voltou. Que assalto era esse, dilatado no tempo, repetido, confuso?
— Olha, um menino tocando matraca! E a gente com dor-de-barriga, pensando que era metralhadora!
Caíram em cima do garoto, que sorveteu na multidão. A senhora gorda apareceu, muito vermelha, protestando sempre:
— É um assalto! Chuchu por aquele preço é um verdadeiro assalto!
Foto de Omotayo Tajudeen: https://www.pexels.com/pt-br/foto/mulher-segurando-tomates-3213283/
Frases de Reflexão
“Nunca diga que a vitória está perdida, pois são de batalhas que se vive a vida”
“A dúvida é um dos nomes da inteligência” – Jorge Luis Borges
“Deus não escolhe os capacitados, mas capacita os escolhidos”
“Na amizade, não importa a quantidade, mas sim a qualidade”
“Tudo o que é bom dura o tempo necessário para ser inesquecível” – Fernando Pessoa
“Somos a resposta exata para aquilo que perguntamos”
“Bom de briga é aquele que cai fora” – Adoniran Barbosa
“A cada minuto que passamos com raiva, perdemos 60 felizes segundos” – William Somerset Maugham
“Tudo o que, um dia, você sonhou, num piscar de olhos pode acontecer. A vida repentinamente muda para quem acredita” – Rouge (modificado)
“Nunca é tarde para recomeçar e é sempre cedo para desistir”
“Que Deus te dê em dobro o que você desejar ao próximo”
“Viva cada dia, intensamente, como se fosse o último, porque um dia poderá ser”
“Se você ama uma pessoa que te faz sofrer, faça dela uma música. Você ouviu, gostou e hoje enjoou”
“Se não veio para ajudar, não atrapalhe”
“A vingança nunca é plena, mata a alma e a envenena” – Seu Madruga
“As pessoas não se tornam especiais pela forma de ser ou agir, mas sim pela profundidade que atinge nossos sentimentos”
“Nunca deixe que a saudade do passado ou o medo do futuro estraguem a beleza do hoje, pois há dias que valem um momento que valem por toda a vida”
“Chorar uma dor do passado no presente é criar outra dor e chorar novamente”
“Quem come e não reparte nada, fica com a barriga inchada” – Chaves
“As pessoas boas devem amar seus inimigos” – Seu Madruga
“Não ligue se rirem de você, pois o riso é a maior homenagem que um idiota presta a um gênio”
Turma da Mônica homenageia os pais



*Retirado da revista 107 do gibi do Cebolinha (Turma da Mônica)
Mafalda en español
Já leram as tirinhas da Mafalda em espanhol? São maravilhosos! Veja:





Pérolas do Jornalismo
Notícia: “Biblioteca terá livro gravado em Fita K-7 para surdos”
Comentário: Será que os surdos conseguem ouvir Fitas K-7
Notícia: “A nova terapia traz esperanças a todos que morrem de câncer a cada ano”
Comentário: Viva a ressurreição!
Notícia: “Apesar da meteorologia estar em greve, o tempo esfriou ontem intensamente”
Comentário: Não pagaram os direitos do El Niño, olha no que deu!
Notícia: “Os 7 (sete) artistas compões um trio de talento”
Comentário: Alguém aí tem calculadora?
Notícia: “No corredor do hospital psiquiátrico, os doentes corriam como loucos”
Comentário: É mesmo? Que coisa impressionante!
Notícia: “Ela contraiu a doença na época em que ainda estava viva!”
Comentário: Que azar, coitada!
Notícia: “O aumento do desemprego foi de 0% em novembro”
Comentário: Onde vamos parar desse jeito?
Notícia: “O presidente de honra é um jovem septuagenário de 81 anos”
Comentário: Quanta confusão!
Notícia: “Parece que ela foi morta pelo seu assassino”
Comentário: Como conseguiram desvendar o mistério?
Notícia: “A polícia e a justiça são as duas mãos de um mesmo braço”
Comentário: É, todo mundo já sabia que eram defeituosas.
Notícia: “O acidente foi tristemente no célebre Retângulo das Bermudas”
Comentário: Retângulo das Bermudas?
Notícia: “Quatro hectares de trigo foram queimados. A princípio trata-se de um incêndio”
Comentário: Achei que fosse uma churrascaria vegetariana.
Notícia: “O velho reformado, antes de apertar o pescoço da mulher até a morte, se suicidou”
Comentário: A volta dos mortos-vivos.
Notícia: “Na chegada da polícia, o cadáver se encontrava rigorosamente imóvel”
Comentário: Viu como ele é disciplinado?
Notícia: “O cadáver foi encontrado morto dentro do carro”
Comentário: Por pouco não pegam um cadáver vivo.
Retiradas do site falhanossa.com.br (que não existe mais)
Asterix e Obelix
Se tinha uma história em HQ que eu curtia muito nos meus tempos de Ensino Médio, essa era “Asterix e Obelix”

Eles foram criados na França por René Goscinny, em 1959 e Albert Uderzo, em 1959 e é baseado no povo gaulês.
Não lembro de muitas histórias, porque faz tempo que as li, mas sei que eles tomavam uma poção para enfrentar uma galera do mal, pois ela os deixava mais fortes temporariamente. No jogo de super nintendo também era assim (saudades, inclusive). O único que não tomava a poção era Obelix, que caiu dentro de um caldeirão cheio e isso fez com que ele tivesse força infinita.
Vale a pena ler as historinhas desses dois, são bem divertidas.
Verdadeira Amizade
Lenda Judaica
Conta esta lenda judaica que dois amigos cultivavam e dividiam o mesmo campo de trigo, trabalhando arduamente a terra com amor e dedicação numa luta estafante, às vezes inglória, sempre à espera de um resultado compensador.
Anos a fio lidaram com a terra, obtendo pouco ou nenhum retorno, até que um dia finalmente a natureza respondeu e regalou-os com uma grande safra, perfeita, magnífica, satisfazendo os dois agricultores que a repartiram igualmente, eufóricos.
Trabalharam na colheita o dia inteiro e depois cada um seguiu o seu rumo.
À noite, já no leito, cansado da brava lida daqueles últimos dias, um deles pensou: “Eu sou casado, tenho filhos fortes e bons, uma companheira fiel e cúmplice. Eles me ajudarão no fim da minha vida. O meu amigo é sozinho, não se casou, nunca terá um braço forte a apoiá-lo. Com certeza vai precisar muito mais do dinheiro da colheita do que eu”.
Levantou-se, silencioso para não acordar ninguém, colocou metade dos sacos de trigo recolhidos na carroça e saiu.
Ao mesmo tempo, em sua casa, o outro não conciliava o sono, pensando: “Para que preciso de tanto dinheiro se não tenho ninguém para sustentar, já estou velho demais para ter filhos e não penso mais em me casar? As minhas necessidades são muito menores do que as do meu sócio, com uma família numerosa para manter”.
Não teve dúvidas: pulou da cama, encheu a sua carroça com a metade do produto da boa terra e saiu pela madrugada fria, dirigindo-se à casa do outro. O entusiasmo era tanto que não dava para esperar o amanhecer.
Na estrada escura e nebulosa daquela noite de inverno, os dois amigos encontraram-se frente a frente. Olharam-se espantados, mas não foram necessárias palavras para que entendessem a mútua intenção.
Amigo é aquele que no seu silêncio escuta o silêncio do outro.

